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(texto roubado - com a devida vénia - ao blog da Teresa Lopes)
Aqui há uns anos participei num projecto fantástico, em Braga, que envolveu o Sindicato da Poesia e a Biblioteca Pública de Braga - Universidade do Minho. Éramos um grupo enorme, alguns profissionais, outros virgens nestas coisas do teatro. Chamou-se Os Malditos do Século - Pecados e Virtudes. Durante dez meses fizeram-se leituras encenadas dos sete pecados e das três virtudes. Tive a sorte de poder participar na Gula, na Inveja e na Ira (só pecados!...)
A vivência desse tempo foi única e inesquecível. Aprendi imenso sobre muitas coisas da vida e bebi os ensinamentos do José Miguel Braga, do António Fonseca, do António Durães e da Sandra Faleiro, estes mais directamente, mas de muitos outros nomes que não caberiam aqui.
De um desses espectáculos, a Ira, relembro um poema de Laurie Anderson, que eu "despejava" na cara do Zé Miguel Braga:
Já não gosto da tua boca.
Já não gosto dos teus olhos.
Já não gosto dos teus olhos.
Já não gosto da cor das tuas camisolas.
Já não gosto.
Já não gosto da cor das tuas camisolas.
Já não gosto do modo como seguras nas canetas e nos lápis.
Já não gosto.
A tua boca. Os teus olhos.
O modo como seguras nas canetas e nos lápis.
Já não gosto. Já não gosto.
Partíamos daqui para uma normal discussão entre marido e mulher e acabava com o Zé Miguel a "despejar-me" na cara um texto de António Manuel Revéz:
... Estava assim, numa paz estranhíssima, firme. Estava pronto e decidido a rebentar-te os miolos com um tiro apenas. Mas tu gritaste-me, tu berraste-me para ter calma. E eu, agitado, nervoso, descontrolado, descarreguei e carreguei a arma até me sentir calmo. Até não restar nada reconhecível de ti.
Lembras, Zé Miguel, que enquanto ensaiávamos e a Sandra Faleiro nos pediu que simulássemos uma discussão, eu te irritei tanto que tu me pregaste uma valente bofetada? E que andaste muito tempo a dizer oh, Teresa, desculpa! Nessa cena, fez-se um silêncio de morte na sala e eu, depois de uns segundos de surpresa, continuei com a discussão. Quando a Sandra disse que bastava, o silêncio ainda reinava entre os presentes e acabámos a trocar impressões sobre a cena e sobre a bofetada, que, diga-se de passagem, tinha sido bem merecida.
Para meu bem, não a incluímos na cena final...
Ficou-me a grata lembrança desses tempos e a saudade de momentos que nos enchiam a alma.
Este fim-de-semana reencontrei o António Durães. Trocámos breves palavras, mas ficou a promessa de que irei ao São Luís, em Julho, ver ou D. Giovanni, ou D. Juan, ou as leituras encenadas em torno de Frei Luís de Sousa, que o Teatro Nacional de São João traz a Lisboa.
Vai ser bom rever o seu trabalho em cena e rever os tempos em que eu até levei uma bofetada na cara...
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